sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Sobre o que faz a diferença

O Gordo, vulgo meu pai, me ensinou muitas coisas nessa vida. Algumas delas foram ensinadas há tanto tempo, e hoje já são tão naturais, que talvez eu nem saiba que foi com ele que aprendi. Então, acho que é justo dizer que não sei qual desses ensinamentos foi o mais importante. Mas eu sei de qual deles eu mais gosto.

O Gordo me ensinou que sempre que a gente admira uma pessoa, sempre que tem um elogio a fazer, sempre que tem algo de bom a dizer para alguém, a gente deve dizer.

Eu sempre lembro disso. E sempre tento colocar em prática. Algumas vezes é fácil, noutras é mais difícil. Mas uma coisa é certa: toda vez que eu tenho vontade de dizer algo legal para alguém e não o faço, fico me remoendo depois. E hoje foi um dia em que eu não podia deixar isso acontecer. Porque hoje foi um dia muito, muito especial.

Pensem em um dos maiores bambambans da área em que vocês trabalham, uma pessoa que vocês admirem muito. Pensem que os textos desse bambambam foram a porta de entrada pra vocês gostarem da área em que atuam. Agora imaginem que, graças a uma ação direta desse bambambam, que vocês nunca conheceram pessoalmente, vocês tenham conseguido alcançar algumas das maiores conquistas acadêmicas que já tiveram até então.

Pois é. Foi esse bambambam, ou melhor, ESSA bambambam que eu conheci hoje.

Quando eu resolvi mudar completamente de área no doutorado, os primeiros textos que li foram da professora Mahzarin Banaji. Fiquei encantada com os escritos dela e a admiração cresceu quando soube um pouco mais da sua história. Banaji é uma pioneira. Ela nasceu e cresceu na Índia e veio para os Estados Unidos fazer pós-graduação. Ainda na década de 80, quando não era tão comum as mulheres terem espaço na ciência, ela foi contratada para ser professora de Yale. Aqui, ela deu início a um dos maiores e mais bem sucedidos projetos do mundo no que diz respeito ao estudo de preferências implícitas (é com isso que eu trabalho). Banaji ficou em Yale até 2001, quando teve seu passe comprado por Harvard, onde está até hoje.

Só isso já seria suficiente para eu admirá-la pra caramba. Mas não foi só isso.

Há 2 anos, a UFRGS lançou a primeira missão internacional de curta duração no exterior, que é um dos projetos mais fantásticos que eu conheço. A universidade banca uma viagem de 10 dias pra qualquer lugar do mundo para que alunos de pós-graduação façam contatos com algum professor com o qual queiram desenvolver um trabalho em conjunto. É preciso ter um projeto, contatos prévios, carta de recomendação, enfim... É uma seleção rigorosa porque é claro que há muito mais alunos interessados do que bolsas disponíveis.

Quando a primeira missão foi lançada, em 2011, ninguém sabia muito bem do que se tratava. Eu li o edital e pensei: "bah, que troço mais sensacional, pena que não tenho nenhum contato". Os dias foram passando e, perto do prazo final, me caiu a ficha: "não tenho nenhum contato porque não fiz nenhum contato...dã!". Então, ainda sem saber bem o que exatamente faria no doutorado, comecei a pensar em todos os textos que havia lido nos últimos tempos. E a resposta sobre quem deveria contatar veio muito clara na minha cabeça: Mahzarin Banaji.

Mesmo sabendo que tinha pouco tempo, mesmo sabendo que seria difícil receber uma resposta de uma das professoras mais requisitadas de Harvard, mesmo sabendo que a mulher era presidente de uma das mais importantes associações de Psicologia e que deveria ser um bocado ocupada, resolvi jogar minhas fichas nela. Mandei um e-mail me apresentando, contando que tinha a oportunidade de passar uns dias com ela em Harvard e perguntando se ela tinha interesse. Confesso que não tinha maiores expectativas de receber uma resposta em tempo hábil. Mas ela veio. No mesmo dia. Na verdade, poucos minutos depois.

Não, não foi uma resposta positiva e nem sequer simpática. Não deu oi, não deu tchau, escreveu duas linhas. Ela dizia que estava em um ano sabático, mas que eu deveria tentar contato com um ex-aluno dela.

Na época eu não sabia que aquela era a melhor resposta que eu poderia ter recebido.

Fiquei bem desanimada, mas resolvi tentar e mandar o e-mail novamente, mesmo tendo praticamente certeza de que o raio não cairia duas vezes no mesmo lugar e que eu não receberia uma resposta rápida de novo. E de novo me enganei. A resposta veio no mesmo dia. E não eram duas ou três linhas, mas três parágrafos (e quem já trocou e-mails com um professor norte-americano sabe como isso é raro).

Esse foi o pontapé para uma troca de e-mails entusiasmante e, em uma semana, meu projeto de doutorado estava praticamente pronto. A coisa foi tão incrível que eu já tinha decidido viajar para Princeton com recursos próprios caso não fosse contemplada pela missão internacional. O resto da história vocês conhecem... Ganhei a missão, aproveitei a viagem para aprofundar todos os detalhes do projeto, o tal professor virou meu co-orientador e dois anos depois esse mesmo projeto me rendeu uma das mais prestigiadas bolsas de doutorado sanduíche que eu poderia conseguir.

E tudo começou com a Banaji.

Então, quando tive a oportunidade de vê-la retornar à sua antiga casa hoje, para dar uma das conferências mais importantes de Yale (em 100 anos, ela é apenas a segunda pessoa da Psicologia a ter essa honra), não consegui não pensar no meu pai. E foi com os olhos cheios d'água que, ao final da conferência, me obriguei a respirar fundo e ir agradecer por tudo que, mesmo sem saber, ela fez por mim.


E vou contar pra vocês... Apesar de ela ser conhecida como "mãe de arame" (leitores fiéis e atentos entenderão), eu não fui a única pessoa que ficou emocionada com o encontro.

7 comentários:

  1. E eu vou ter dúvidas que Bibi Lili Fifi vai ser Secretária Geral da ONU?! Deus me livre!

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  2. O Sr. de Pano apresenta a Sra. de Arame! :D
    Muito legal que foste falar com ela! E, me diz uma coisa, qual foi a pérola que soltaste para a Dra. Banaji-de-óculos-muito-do-estileiro, hein?! :)

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  3. Mas, gente, tem que chorar todo post que eu leio nesse blog??? E concordo com a tua mãe, Morena, é certo que tu vai ser Secretária Geral da ONU. Adorei!

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  4. No meu balcão tem duas gavetas mágicas. Abrem ao aceno das mãos, É lindo ver Mariana e Lívia atraindo-as ao apelo do vem,,.vem...vem,,, Outra vez vô! vem...vem...vem... É irresistível a pureza infantil, todos cedem ao afago, ao vem...vem...vem...

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  5. É certo que senti algo estranho, né Lili Bibi Fifi?!

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  6. Que irado!
    Ela deve ser foda mesmo, só alguém muito foda pode usar um óculos daqueles!

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